Por Dionéia Gaiardo – Filósofa Clínica
“O ponto de vista Partilhante, ao se deixar acessar pelos termos agendados, reivindica um leitor de raridades. O fenômeno terapia aproxima papéis existenciais da clínica com a arqueologia. Sua estética cuidadora, a descobrir e proteger inéditos, mescla saberes para acolher as linguagens da singularidade.” – Hélio Strassburger
O trecho citado está na obra “A palavra fora de si” do professor Hélio e especificamente no texto dedicado “As linguagens da terapia”. Aqui é essencial dar-se conta de que o veículo que nos faz percorrer caminhos dentro do espaço clínico é a linguagem, e nesse sentido, é papel do cuidador dar espaço de passagem e fornecer proteção às cenas que se des-cobrem sessão após sessão, acolhendo o conteúdo.
Durante esses 4 anos de clínica, atendi algumas mulheres (sim, hoje falarei delas). Sou grata pela confiança que depositam no processo clínico, sei dos meus limites de filósofa clínica aprendiz, isso não nos impede de fazer boas construções compartilhadas. Aliás, com algumas delas compartilho a busca pelo aperfeiçoamento de si, com outras compartilho as dores de repressões sociais, negligências, confusões em que nos colocamos, bem como o insurgir-se diante disso, afirmando-se a partir da singularidade, essa coisa sagrada da natureza de cada uma.
Com algumas compartilho a paixão pelas artes, a estética da vida, o poder de transformação. E tem sido incrível, no sentido de fantástico mesmo, acompanhar as autogenias que se desdobram, esses fenômenos que se ensaiam no momento clínico. Interessante observar que algumas vezes os ensaios proferidos nesses instantes, ressoam tal qual foram proferidos, outras vezes, o que aparece é inédito e aí, insisto, faz-se fundamental proteger esses inéditos.
Mas como a filósofa clínica protege os inéditos de cada uma? Deixando ser. Aquilo que se des-cobre, se revela. Da mesma forma como antigamente se revelavam as fotografias. O filme da vida da partilhante está ali, dentro do “negativo” a ser revelado, inicialmente, para ela mesma. Essa que pega nas mãos a imagem de si revelada por si mesma e faz com ela o que quiser, mostra, esconde (guarda), dos outros, de si mesma.
A filósofa clínica é esse ponto de apoio, até que a partilhante reestruture sua sustentação e passe a, não mais necessitar desse ponto como apoio. A partir daí, pode ocorrer uma expansão do seu ser em direção ao mundo, caso isso lhe seja importante. Em alguns casos a expansão de si para si mesma já é suficiente.